De nosso amor e loucura...

Alguns de nós, eu inclusive, já vimos acalentando a ideia de criar este blog. Fazemos, de certo, parte de um grupo que não se entende como apenas professor, pessoas que criam contos, crônicas, novelas e têm receios de expor suas produções. Somos loucos... loucos pelo ócio mais trabalhoso que existe: escrever Utilizamos as palavras de Clarice Lispector para definir nossa loucura... "Escrevemos porque somos desesperados e estamos cansados, não suportamos mais a rotina de nos ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, nós nos morreríamos simbolicamente todos os dias."

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Viagem inusitada


      Não procuro nada além de simples relações, um pouco de prazer e carinho; alguém para ouvir e  que seja bom ouvinte.                                                                                                                    Alguém para beijar, sorrir...

ELEVADOR DÁ PÂNICO EM UNS, EXCITA OUTROS. E produz histórias. Muitas. Quem não conhece ao menos uma? Desde as engraçadas, como as exibidas na TV, em comercial ou não, como aquela em que dois homens, gaiatos, conversam num elevador lotado sobre fictícia doença infectocontagiosa de um deles, sob esgares e olhares medrosos dos outros passageiros e, claro, escárnio dos dois; até notícias trágicas que contam sobre elevador que despencou indo até o poço e matando todos os ocupantes, ou sobre aquele homem que abriu a porta e, inadvertidamente, embarcou num elevador que não estava ali e... morreu. Foram, aliás, acontecimentos como este último que geraram aquele abominável adesivo obrigatório que diz: ... “verifique se o mesmo...”.
Tenho cá minhas relações com elevador, às vezes ressabiadas, quando se trata daqueles em prédios velhos do centro da cidade. Aqueles com portas pantográficas. E às vezes bem amistosas, como com aqueles em prédios modernos, decorados com espelhos enormes que nos facilitam ajeitar o cabelo, limpar os olhos, puxar um fiapo do dente...
Moro num 11º andar, então elevador faz parte de minha rotina. Semanas atrás, chegando a casa mais cedo, 8h da noite, encontrei minha vizinha porta-com-porta na garagem, e juntos embarcamos.
Mulher de uns 40 anos, simpática, charmosa, um mulherão. Cheia de saltos, bolsas, pulseiras e colares, claro que tudo em perfeita harmonia. E mais! Conversa em português escorreito, fala de si, interessa-se pelo interlocutor, olha nos olhos... Meu irmão diz que ela dá de dez nas duas filhas; por sinal, duas gatas.
Íamos a conversar sobre os trâmites de seu divórcio. Sim, divorciada, de um cabra velho, chato e, dizem, louco por quenga. Então um tranco e o elevador parou no 7º andar. Não subia, não descia, não abria a porta. O interfone não funcionava. Só faltava a luz apagar...
Não sou homem de entrar em pânico. Nem minha charmosa vizinha o era. Olhamo-nos e foi como se nos disséssemos easy going! Toc, toc, toc, alguém do lado de fora perguntava se havia alguém preso. Era um morador do 7º, deu-nos umas dicas que fariam a porta abrir. Debalde. - Calma aí, disse-nos, o porteiro vai vir com a chave. Veio o porteiro com a chave, choc, choc, choc e... nada! Teríamos que aguardar a vinda de um técnico. Sugeri então a minha bela vizinha: vamos sentar e aguardar. Dei um jeito de abrir uma fresta na porta para que entrasse algum ar. Ela ligou para as filhas. No máximo em meia-hora seríamos libertados. Mas não foi bem assim...
A cena era impactante. Nós dois sentados no chão do elevador. Não éramos como dois sacos de batatas. Estávamos os dois bem vestidos; mochila, bolsa, chaves, saltos altos, botas, capacete a decorar o chão do ambiente.
E nos pusemos a conversar. Conversar por delicadeza quando não se quer falar e não se tem sobre o que falar é uma maldição, pois não? Felizmente não foi esse o caso. Eu estimulava e ela se punha a contar... contou-me do cachorro do ex-marido, das filhas, falou da loja de moda feminina que mantém no bairro, das dificuldades financeiras... eu falei daquilo que me era mais presente: Brasília, cidade onde ela, aliás, morou por anos. Foi agradável ter com quem trocar as felizes impressões que a cidade me deixara. Contou-me mais... contou-me do gostosão do prédio, verdadeiro deus, casado, que lhe deixara cantada por escrito sob sua porta. Devidamente esnobado.
Já conversávamos havia uma hora quando o subsíndico, o cabra mais simpático do prédio, libertou-nos. E nem acreditou ao ver saírem lá de dentro aqueles dois tão sorridentes, como saídos de um coquetel.

Oswaldo Lucas-Jr                                                                                                                                                                                  olucasjunior@gmail.com                                                                                                                                                                               13 de setembro de 2012

Fragmentos de um diário


Esse som mais uma vez. Demorou para chegar neste ano. Eu gosto. Embora seja o mesmo som que ungiu aquela madrugada. Cada uma de suas gotas me remete a um fragmento de alma que perdi no processo. Eu estou aqui, tomando uma xícara de café morno e amargo, lembrando dela enquanto escrevo estas linhas. Provavelmente está em qualquer lugar bem longe daqui; a esta hora, adormecida em sonhos que ignoram meus pesadelos.  Claro, Maria Eduarda não tem culpa de o céu amanhecer coberto por nuvens, tampouco de que me sinta tão imerso nessa nébula que toma meus julgamentos assim como o torpor de uma tempestade repentina que, por um breve momento, desvia o pássaro de sua rota.
Talvez (só talvez) eu não queira atribuir a “culpa” de minha angústia a uma pessoa só. Talvez o pesar de minha paixão seja demais para atribuir a uma simples experiência. Todavia, não posso ignorar Maria Eduarda que, embora distante, me aparece tão clara em cada lugar para onde direciono minhas vistas. A cor de sua pele, o timbre de sua voz, o calor indescritível de um sonho compartilhado.
Pra falar a verdade, sempre achei ridículo o fato de acreditar no calor que uma pessoa poderia sentir no peito apenas por se apaixonar. E ainda acho, pois Maria Eduarda não me transmitiu simples calor. Os sentimentos inflamavam a alma e a carne entorpecendo cada pedacinho de minha essência. Minha natureza foi tocada profundamente, mudando conceitos de passado, presente e até futuro. Não é como se estivesse vivendo por causa daquela pessoa. É como se, ao longo do tempo que vivi, meu corpo tivesse se tornado um recipiente para algo totalmente novo.
A princípio, o encanto pelo belo se tornou meu clichê favorito. Ainda que de pele morena, estava convencido de que, todo e qualquer raio de luz que pudesse alcançar minha face numa manhã teria que ter vindo de sua própria existência. Sua voz não era “bela como uma música” (pois basta que ponha uma música de que goste como tom para seu despertador que logo você passa a detestá-la). Era bem mais, um verdadeiro maná diante de todo caos que me assolava durante a algazarra dos dias ou a quietude das noites.
Mas o que me pergunto dia após dia é se minha alma foi insuficiente ou se Maria Eduarda derramou uma porção maior do que deveria.
Afinal, eu estou aqui escrevendo sobre isso enquanto ela exibe seu escárnio sobre o assunto e desdenha o olhar que lhe oferece amor e abusa do seu papel de protagonista numa propaganda enganosa.
Dias, meses ou anos passam e a alma despedaçada parece esperar pelo frenesi que poderia restaurar tudo como era antes. Mas ela não faz nada. O cenário se torna cada vez mais tétrico nas páginas deste diário que, gentilmente, recebe uma parcela discreta de minha revolta. Afinal, ela nunca saberá o que escrevo aqui. Maria Eduarda nunca saberá como seu nome foi tão amado (?) por mim.
Talvez seja por isso que escrevo. Porque ela nunca saberá como, para mim, o cheiro do ar deixou de existir e o sabor da água não me surpreende mais. Para ela, tudo deve ter sido sempre assim... Sem gosto.
Raphael Camboim                                                                                                                
raphaelcamboim@hotmail.com                             
21 de agosto de 2012





Raphael Camboim, 26 anos, estudante de letras. Rapaz discreto, inteligente e extremamente observador. Tem na literatura um universo onde pode expressar-se e compreender ainda melhor o mundo e a sim mesmo. 

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O que nos une e o que nos separa


Estava tentando entender
Que tipo de relação nós temos
O que nos une e o que nos separa
O que realmente oferecemos e queremos

Um mar, uma palavra, um olhar, um lábio, um orgasmo, uma companhia, uma conchinha à noite, uma curiosidade, uma liberdade, uma libertinagem, uma cumplicidade, uma amizade, troca de favores, um cobertor, uma conveniência...

Percebi que tudo o que nos une é também tudo o que nos separa
Nossas dúvidas, convicções, problemas, soluções...
O que nos afasta é o que nos aproxima
Desde tudo o que amamos, até o que mais nos abomina
Nessa doce agonia de estarmos juntos
E saber que a qualquer hora tudo termina.

Giselle Oliveira
15 de agosto de 2012